segunda-feira, junho 14, 2010

Santos 2010: o rescaldo

Livre dos compromissos que nos últimos dois meses andaram a moer-me a tola, Sábado fui aos santos. E ir aos santos é todo um programa sociológico, porque é nestas ocasiões em que se percebe verdadeiramente o que é ser português. E ser português, como pude partilhar com o pessoal que me acompanhou no caminho para Lisboa, é estranho: nós não conseguimos aguentar, sem reclamarmos, que uma pessoa sequer esteja à nossa frente numa fila (eu sei, porque sou assim. Seja no supermercado, nas finanças ou em qualquer outro sítio, basta estar uma pessoa antes de mim para eu começar logo a disparatar), mas não nos importamos de marrar com outras pessoas nem de conseguirmos andar somente 2 metros a cada 10 minutos por entre um mar de gente se, pelo meio, houver bebida e comida. No fundo, nós gostamos de confusão e de maralhal, mas só se conseguirmos enfardar e beber à grande. Isto é ser português, e se o José Gil tivesse falado nisto em vez de mandar que a nossa característica mais predominante é a "não inscrição no real", talvez o Portugal, Hoje: o medo de existir, fosse um livrinho de jeito.

Também muito interessante de observar nos santos (eu gosto muito de observar. Faz parte da minha natureza voyeurística. E agora tentem dizer "natureza voyeurística" aos vossos colegas de trabalho sem se rirem!...), além das tentativas de velhotes rebarbados em engatar menininhas imberbes (contei uns quantos. Um deles até tentou algo comigo. Devia estar confuso, coitado...), é a forma como as modas evoluem nestes eventos. Todos os anos há algo novo. Por exemplo, aqui há dois anos proliferava uma espécie de pulseiras ou fitas fluorescentes; no ano passado não sei porque não pus os pés em Lisboa; este ano, o último grito não eram as vuvuzelas, felizmente, embora tivesse escutado umas duas ou três, mas sim uns chapéus a imitar manjericos. Adereço ridículo, sim, mas que dava azo à imaginação javarda. Tantas, tantas vezes vi raparigas com aqueles chapéus e tantos, tantos rapazes dizendo-lhes "eh porra, mas que linda manjericona!"... Tantas, tantas...

Outro aspecto sociologicamente relevante prende-se com o romper das amarras de classe. Em dias normais, os jovenzinhos de, digamos, boas famílias só convivem com o povo quando é para o espezinhar. É a herança paterna que fala: filhos de betos, de tios e de capitalistas possuem, geneticamente, tendência para se acharem acima do povo, o que os leva ao PSD, ao CDS e ao Bloco de Esquerda (ninguém me tira da ideia que o Bloco de Esquerda é um partido criado por aristocratas com a intenção de se infiltrarem na esquerda de forma a destruí-la a partir de dentro...). Bom, esta gentalha muda completamente a pose aquando de eventos como os santos populares. Aqui, o betinho de cabelo ao lado e camisinha com o botão de cima estrategicamente desabotoado come e bebe e dança descontraído com os drogados dos Olivais ou, pasme-se, com os imigrantes asiáticos do Martim Moniz. E a pitinha tiazorra que só lê a Cosmopolitan e não se chega a menos de 10 metros de um representante da classe média-baixa, quando vai aos santos é vê-la a roçar-se junto do agarrado desdentado enquanto bebe um copo de 3. Isto também é ser português e leva-me a pensar se o caminho para o socialismo, em vez da revolução e da luta de classes, não será antes uma sardinhada...

Por último, um desabafo. Há algo de muito errado a passar-se comigo. Eu fui no Sábado aos santos única e exclusivamente, e aqui cito uma autoridade suprema - eu próprio - para "apanhar uma bebedeira monstra". Porém, bebi, bebi, bebi, bebi e bebi, e embebedar-me nicles. NICLES! Jorrei (porque o termo correcto é mesmo este, jorrar) sangria para a goela; enfrasquei-me de cerveja preta; ajudei um amigo a mandar abaixo uma garrafa de litro de ginjinha - mas nada de ficar bêbedo. Nem tonto para além do normal fiquei. Ou o meu fígado adquiriu super-poderes, ou então já não sei mais nada. O que é preciso fazer para me embebedar? Gastar o equivalente à dívida externa portuguesa para 2012 em álcool?!?! Não percebo...

1 comentário:

Lexy disse...

Chama-se evolução...o teu fígado está imune..eu sou apologista de um transplante,isto de fígados a processar o álcool à velocidade da luz não dá com nada nestes bailaricos.