Ora vejam lá isto:
"A alimentação da família real era (...) bastante escrutinada: um rei que arrotava e que emitia muitos ruídos enquanto comia era criticado, o mesmo acontecendo com os membros da família régia que se alimentavam em quantidades imoderadas (...). O príncipe Filipe - futuro D. Filipe II de Portugal - gostava muito de comer, ao ponto de García de Loyasa lhe ter recomendado, em 1591, que se moderasse. E também as mulheres da família real estavam sujeitas a este tipo de escrutínio: D. Maria Francisca, por exemplo, gostava de beber grandes quantidades de vinho, tendo sido por diversas vezes repreendida por Pedro II, seu marido. São vários os observadores estrangeiros que criticam, também, a falta de maneiras dos reis portugueses à mesa, de que o caso mais espectacular é, talvez, o de D. Pedro II durante a década de 1960, diversas vezes visto por um diplomata francês a comer um naco de carne, usado somente as mãos e sentado num toco de madeira.
Muito criticado também foi D. Afonso VI por causa dos seus hábitos alimentares. Para além da falta de moderação a comer, distinguia-se pela sua intemperança, pela sua predilecção por carne crua e pelo facto de gostar de comer na cama, comportamento tido como indecoroso, não saudável e, até, antinatural."
Muito criticado também foi D. Afonso VI por causa dos seus hábitos alimentares. Para além da falta de moderação a comer, distinguia-se pela sua intemperança, pela sua predilecção por carne crua e pelo facto de gostar de comer na cama, comportamento tido como indecoroso, não saudável e, até, antinatural."
Citação retirada de Pedro Cardim, "A corte régia e o alargamento da esfera privada", in História da Vida Privada em Portugal: A Idade Moderna, Lisboa, Temas & Debates, 2010.
"Portantos", vamos lá a ver se eu percebi bem: o povo, isto é, a gente comum, é tantas e tantas vezes acusado de conduta inadequada à mesa, de má educação, de javardice e tal só porque, de quando em vez, lança um ou outro arroto ou até um gás, mas e o que se verifica com as nossas grandes figuras de estado?!? Uns também arrotavam (deve ser a isto a que se referem os monárquicos de hoje em dia quando falam da proximidade entre povo e reis...), outros eram glutões, outras embebedavam-se, e assim por diante. E o que dizer do Afonso VI? Pá, o Afonso VI é de outro mundo: carne crua?!?! Comer na cama?!?! Estou mesmo a ver a rainha consorte, D. Maria Francisca (sim, a mesma bêbeda que, depois da deposição de Afonso VI, viria a casar-se com Pedro II), no leito real a virar-se para o Afonso e perguntar-lhe: "Olá! Mas o que é isto aqui tão rijo que estou a sentir entre as pernas de Sua Majestade? É hoje que vamos consumar o nosso matrimónio?", só para ter como resposta um "Não, estúpida! Isso é o pernil de perú que sobrou do jantar. Está aí guardado porque daqui a pouco vou dar-lhe uma trinca". E depois desta frase, claro, arrotaria. E peidava-se. Enfim, não admira que lhe tenham posto um processo em cima.
E ainda há quem olhe de lado para mim quando, num restaurante público, eu coço os tintins depois da sobremesa... Tenham juízo, caramba!
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