[Continuação]
Eu: Então... bom... então... fui dar uma volta de bicicleta, sabe...
Psiquiatra: Sim?...
Eu: Pois, e pedalei bastante, sabe... mas... ai, é tão difícil falar!
Psiquiatra: Vamos ficar nisto o resto da sessão, é? Recordo-lhe que cobro à hora.
Eu: Mas custa tanto... Bom, já no regresso, pedalava eu todo contente, quando nisto vejo passar por mim, numa velocidade considerável e que eu não podia acompanhar, um... um... um...
Psiquiatra: Um quê?! Um arquétipo jungiano?! Um behaviorista?! Um Carlos Amaral Dias?!
Eu: Não... um... um... UM GORDO! Uhhhhhh, buáááááá, uhhhhhhh!
Psiquiatra: Mas então... então você põe-se a chorar por isso?! Foi ultrapassado por um gordo e fica assim?! Ó homem, recomponha-se, caramba! Foi por isto que veio consultar-me?
Eu: S-s-s-sim...
Psiquiatra: Ó que diabos! Você sabe o que eu tenho de aturar neste consultório, sabe?! Daqui a três horas, recebo um casal que só consegue ter relações sexuais quando ele se veste de panda e ela recita versos da Anna Akhmatóva. Isto é que é um caso clínico, agora o seu só dá vontade de o mandar prender.
Eu: Mas o tipo era mesmo gordo, tinha mais de 120 quilos, de certeza. A doutora não faz ideia de como eu fiquei, eu, um jovem elegante e em excelente forma física, eu, que numa corrida de 100 metros poderia perfeitamente competir com o Usain Bolt, vi-me a comer a poeira de um trambolho! Isso destroçou-me a psique, e quero saber o que a senhora psiquiatra pode fazer quando a isso. Ah, já agora, eu e a minha esposa só conseguimos ter relações sexuais quando eu me visto de leão e ela recita os quatro primeiros capítulos da Montanha Mágica do Thomas Mann. Portanto, trate-me que é para isso que lhe estou a pagar.
Psiquiatra: Retiro o que disse. Você é completamente louco. Começo a ponderar seriamente mandar interná-lo.
Eu: Ehhhhh, tanta coisa só por causa de um gordo, também não. Contento-me com uns medicamentozinhos ou coisa assim, tipo, a doutora receita-me umas merdas e eu deixo de pensar em gordos, ou manda-me fazer uma cura num SPA e eu fico a acreditar que gordos não existem. Não é isso que vocês psiquiatras fazem?!
Psiquiatra: Mas você vem aqui ensinar-me como se faz o meu trabalho, é?! Eu estou na psiquiatria há 22 anos, tenho o diploma ali pendurado na parede, pratiquei Logoterapia em Viena com o doutor Viktor Frankl, ajudei a tratar futebolistas esquizofrénicos da terceira divisão venezuelana, dormi com todos os participantes masculinos ao 9º Congresso Mundial de Psiquiatria, e agora vem o senhor Peter of Pan pôr tudo em causa só porque uma pessoa ligeiramente acima do peso passou por ele de bicicleta!... Ora, ele há com cada uma...
Eu: Permita-me discordar, mas não era uma pessoa ligeiramente acima do peso. A doutora não estava lá: era um gordalhão do caraças! E isso traumatizou-me. Vai ou não vai tratar de mim?!
Psiquiatra: Se concordar em ser internado, posso pensar nisso. Mas primeiro, interna-se. Você parece-me demasiado perigoso para ser deixado aí à solta.
Eu: Perigoso, eu? Eu sou um amor de pessoa. E perfeitamente normal. Tirando este caso com o gordo ciclista, nunca tive nada que me levasse a precisar de ajuda. E olhe que sou sportinguista!
Psiquiatra: O que você é, é um maluco da cabeça.
Eu: Mau! Agora ofensas, é?! Sabe que quando era criança, confundia psiquiatra com psicopata. Estou a ver que, afinal, tinha razão... não sei por que está a fazer-se difícil. Arranje-me lá uns comprimidos para eu deixar de pensar em gordos, vá. Custa-lhe muito, é? Se eu tivesse ido tratar disto com o professor Bambo, já estava curado e ele ainda me oferecia uma mezinha para utilizar contra o mau-olhado.
Psiquiatra: Mau, então rebaixa-me, é?! Por que não usou toda essa fúria contra o gordo que o deixou para trás?! Sabe que mais?! É muito bem feito, ihhhhh, um gordo ultrapassou-o, ah ah ah, gordos, gordos, gordos, viva a gordura e o Peso Pesado, ehhhh, gordura é formosura, bicicletas para todos os gordos do mundo, ahhhhhhh, gordos, gordos, gordos, vivam os gordos...
Eu: Olha, a gaja enlouqueceu. Eu bem digo que os gordos traumatizam uma pessoa!
E foi assim. Vim-me embora da minha primeira consulta, não paguei e deixei a psiquiatra a falar sozinha. Parece que agora está no Miguel Bombarda a ser tratada. Um amigo meu que é maluco e está lá internado falou-me ontem numa tipa que apareceu no pátio vestida de ornitorrinco a pedir sexo com gordos que soubessem representar peças do Ionescu. É ela, só pode ser ela...
Já eu continuo sem ter solução à vista para o meu problema do gordo que me ultrapassou. Temos porras!
Eu: Então... bom... então... fui dar uma volta de bicicleta, sabe...
Psiquiatra: Sim?...
Eu: Pois, e pedalei bastante, sabe... mas... ai, é tão difícil falar!
Psiquiatra: Vamos ficar nisto o resto da sessão, é? Recordo-lhe que cobro à hora.
Eu: Mas custa tanto... Bom, já no regresso, pedalava eu todo contente, quando nisto vejo passar por mim, numa velocidade considerável e que eu não podia acompanhar, um... um... um...
Psiquiatra: Um quê?! Um arquétipo jungiano?! Um behaviorista?! Um Carlos Amaral Dias?!
Eu: Não... um... um... UM GORDO! Uhhhhhh, buáááááá, uhhhhhhh!
Psiquiatra: Mas então... então você põe-se a chorar por isso?! Foi ultrapassado por um gordo e fica assim?! Ó homem, recomponha-se, caramba! Foi por isto que veio consultar-me?
Eu: S-s-s-sim...
Psiquiatra: Ó que diabos! Você sabe o que eu tenho de aturar neste consultório, sabe?! Daqui a três horas, recebo um casal que só consegue ter relações sexuais quando ele se veste de panda e ela recita versos da Anna Akhmatóva. Isto é que é um caso clínico, agora o seu só dá vontade de o mandar prender.
Eu: Mas o tipo era mesmo gordo, tinha mais de 120 quilos, de certeza. A doutora não faz ideia de como eu fiquei, eu, um jovem elegante e em excelente forma física, eu, que numa corrida de 100 metros poderia perfeitamente competir com o Usain Bolt, vi-me a comer a poeira de um trambolho! Isso destroçou-me a psique, e quero saber o que a senhora psiquiatra pode fazer quando a isso. Ah, já agora, eu e a minha esposa só conseguimos ter relações sexuais quando eu me visto de leão e ela recita os quatro primeiros capítulos da Montanha Mágica do Thomas Mann. Portanto, trate-me que é para isso que lhe estou a pagar.
Psiquiatra: Retiro o que disse. Você é completamente louco. Começo a ponderar seriamente mandar interná-lo.
Eu: Ehhhhh, tanta coisa só por causa de um gordo, também não. Contento-me com uns medicamentozinhos ou coisa assim, tipo, a doutora receita-me umas merdas e eu deixo de pensar em gordos, ou manda-me fazer uma cura num SPA e eu fico a acreditar que gordos não existem. Não é isso que vocês psiquiatras fazem?!
Psiquiatra: Mas você vem aqui ensinar-me como se faz o meu trabalho, é?! Eu estou na psiquiatria há 22 anos, tenho o diploma ali pendurado na parede, pratiquei Logoterapia em Viena com o doutor Viktor Frankl, ajudei a tratar futebolistas esquizofrénicos da terceira divisão venezuelana, dormi com todos os participantes masculinos ao 9º Congresso Mundial de Psiquiatria, e agora vem o senhor Peter of Pan pôr tudo em causa só porque uma pessoa ligeiramente acima do peso passou por ele de bicicleta!... Ora, ele há com cada uma...
Eu: Permita-me discordar, mas não era uma pessoa ligeiramente acima do peso. A doutora não estava lá: era um gordalhão do caraças! E isso traumatizou-me. Vai ou não vai tratar de mim?!
Psiquiatra: Se concordar em ser internado, posso pensar nisso. Mas primeiro, interna-se. Você parece-me demasiado perigoso para ser deixado aí à solta.
Eu: Perigoso, eu? Eu sou um amor de pessoa. E perfeitamente normal. Tirando este caso com o gordo ciclista, nunca tive nada que me levasse a precisar de ajuda. E olhe que sou sportinguista!
Psiquiatra: O que você é, é um maluco da cabeça.
Eu: Mau! Agora ofensas, é?! Sabe que quando era criança, confundia psiquiatra com psicopata. Estou a ver que, afinal, tinha razão... não sei por que está a fazer-se difícil. Arranje-me lá uns comprimidos para eu deixar de pensar em gordos, vá. Custa-lhe muito, é? Se eu tivesse ido tratar disto com o professor Bambo, já estava curado e ele ainda me oferecia uma mezinha para utilizar contra o mau-olhado.
Psiquiatra: Mau, então rebaixa-me, é?! Por que não usou toda essa fúria contra o gordo que o deixou para trás?! Sabe que mais?! É muito bem feito, ihhhhh, um gordo ultrapassou-o, ah ah ah, gordos, gordos, gordos, viva a gordura e o Peso Pesado, ehhhh, gordura é formosura, bicicletas para todos os gordos do mundo, ahhhhhhh, gordos, gordos, gordos, vivam os gordos...
Eu: Olha, a gaja enlouqueceu. Eu bem digo que os gordos traumatizam uma pessoa!
E foi assim. Vim-me embora da minha primeira consulta, não paguei e deixei a psiquiatra a falar sozinha. Parece que agora está no Miguel Bombarda a ser tratada. Um amigo meu que é maluco e está lá internado falou-me ontem numa tipa que apareceu no pátio vestida de ornitorrinco a pedir sexo com gordos que soubessem representar peças do Ionescu. É ela, só pode ser ela...
Já eu continuo sem ter solução à vista para o meu problema do gordo que me ultrapassou. Temos porras!
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