quinta-feira, setembro 22, 2005

Na esteira de Boécio

Boécio foi um importante filósofo da alta Idade Média. Além de ter executado traduções de Platão, foi responsável por uma obra largamente difundida e ainda hoje bastante apreciada: De Consolatione Philosophiae. Neste texto, Boécio misturava o estilo mais seco do ensaio filosófico com a liberdade literária da composição poética. Dito de outro modo, o que temos aqui é pura poesia filosófica!
Uma das qualidades desta obra - e que a torna tão agradável - é apresentar uma encarnação da Filosofia enquanto atraente e sensível mulher, capaz de consolar o filósofo em momentos de maior dificuldade e amargura (daí o título da composição).
Ora, em honra ao autor, resolvi também produzir um singelo poema no qual a Filosofia assume a figura de uma bela ragazza. É certo que sou menos poético e filosófico do que Boécio, mas por outro lado o meu nome evita ser tão ridículo (se eu conhecesse alguém chamado "Boécio", juro que lhe daria um enxerto de porrada!). Além do mais, se ele pôde personalizar a Filosofia, eu também posso!
Então tomem lá!

A Consolação da Filosofia (versão Eterno Entorno)

Bem isolado andava eu,
Em suave quietude vivia;
Nisto, para espanto meu,
Aparece a Filosofia:

"Olá, belo e charmoso rapaz,
É o pensamento que me traz.
Tenho por missão acompanhar
Aqueles que amam sonhar."

Não disfarcei a surpresa
Perante uma tal visão.
Mas foi a sua beleza
Que despertou meu coração:

"És boa com'ó milho
E de encanto tamanho.
Vamos fazer um filho
E dar-te um andar estranho!"

Pouco se impressionou
Com esta dedicatória.
Em toda sua glória,
Rapidamente retrucou:

"Se estás já armado
Em carapau de corrida,
Deixo-te abandonado,
Vou-me com toda a brida.

Ter por nome Filosofia
Não é algo vão;
Mostra maior simpatia
Ou levas um chapadão."

A gaja era jeitosa
Mas estava teimosa.
Também não desisti,
Pois logo respondi:

"Já estou é farto
Dessas grandes tretas!
Vai para o quarto
E revela tuas tetas!"

A Filosofia pasmou-se
Mas começou a obedecer.
Na cama deitou-se
E lançou este dizer:

"Jamais fui tratada assim,
Com tão pouco respeito!
Oh! Vem até mim,
Delicia-te em meu peito!"

Afinal ela queria
Cometer a vilania;
Aquele pudico ar
Era só para disfarçar.

Não me fiz rogado,
Levei-a às sete luas.
Depois do acto consumado,
Ainda mandei mais duas!

Por isso, digo de viva lei:
Se vos surgir a Filosofia,
Façam como eu faria
Tratem-na como a tratei!

Eterno Entorno



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