sexta-feira, julho 27, 2012

Bater no fundo

Ontem, escrevi aqui algo como "não há nada mau que as pessoas não consigam piorar". Cito de memória, portanto é provável que esteja a ser inexacto comigo próprio, é o que dá ter uma memória de porcaria, por exemplo, hoje não sei onde deixei as chaves do avião, e o facto de não ter um avião não pode servir de desculpa! Bom, mas perceberam a ideia: o que é péssimo pode sempre ficar um pouco mais ruim. 

Nesse espírito, os senhores que estão à frente do canal televisivo conhecido por Sociedade Independente de Comunicação resolveram levar as coisas para outro nível e importaram um programa, a estrear por cá em Setembro ou Outubro, certamente, que só dá vontade de acreditar na profecia maia do fim do mundo. Naquilo a que só se pode chamar de mashup da treta, os criadores desse programa acharam que seria uma ideia maravilhosa misturar o conceito do Dança Comigo com o do Peso Pesado, e então tem-se uma espécie de Dança Com Gordos, em que vários concorrentes, todos com tonelagem acima da média, são desafiados a perder peso à custa de danças em frente das câmaras. (Se quem está a ler isto ainda não vomitou, os meus parabéns: estômago forte é contigo!)

Isto sim, é bater no fundo. Com estrondo. Comparada, a intervenção da Troika no nosso país parece uma coisa celestial. A possibilidade de o Sporting cair para a 2ª divisão também. Ei, até os incêndios que devastaram o Algarve e a Madeira parecem simpáticos e acolhedores se colocados diante de um conceito como o Dança Com Gordos (ATENÇÃO: o programa não se vai chamar assim. Em boa verdade, eu não sei que nome decidiram dar ao raio da coisa. Mas para mim, será sempre o Dança Com Gordos). Não deve haver coisas muito piores do que assistir a isto. 

Quer dizer, é a minha perspectiva, claro. Sei bem que o Dança Com Gordos vai ser um sucesso de audiências. Porque não são só os programas televisivos que bateram no fundo. Os cérebros dos espectadores também. E quem engoliu Big Brothers, Casas dos Segredos, Ídolos e afins vai também engolir o Dança Com Gordos, mesmo que o excesso de gordura obrigue a tomar um Kompensam no fim de cada episódio. E parece-me que vai haver dois tipos de pessoas a vibrar com este programa:
Primeiro, as pessoas empáticas. Estas, na sua maioria gordas, vão estar ali a olhar para outros gordos e gordas e achar que é muito positivo exibir-se assim cachalotes no pequeno ecrã. Estes telespectadores assistirão ao programa com um sorriso nos lábios e clamarão: "Bravo. Esta gorda dança mesmo bem. E já perdeu uns 5 quilitos. Se perder mais uns 200 a dançar, vai ficar uma pessoa normal. Qualquer dia, faço o mesmo". Sim, isto é o que dirão, enquanto comem o terceiro bife que lhes coube ao jantar.
O segundo tipo de pessoas que verá o Dança Com Gordos é o dos gozadores. Gente que só vê para escarnecer e que só está bem a dizer mal dos outros. Estas pessoas farão comentários como "Xiii, olha-se só para aquela morsa. Vê-se mesmo a gordura a cair daqueles tronc... braços. A gaja, para ser considerada obesa mórbida, teria de emagrecer uns 700 quilos. Ihhhh, e agora vai dançar com aquele mastodonte. É melhor reforçarem o chão, senão os dois ainda se afundam, eheheheh, era pegar nestes gordos todos, juntar-lhes a dívida externa e mandá-los ao mar, nunca mais víamos nem uns nem outra, ahahahah, estúpidos obesos..."

Portugal, como bem sabemos, está cheio quer de gordos, quer de maldizentes. E os senhores da SIC sabem disso, daí a aposta num formato que sabem vencedor. Mas isto é mesmo bater no fundo, não tenham dúvidas.

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